Chegou às livrarias mais um Oliver Sacks (A Mente Assombrada, Companhia das Letras, 288 págs., R$ 45), em que ele novamente reúne casos estranhos das mais estranhas doenças neurológicas (um dos anteriores, aqui). A coleção agora é de alucinações e delírios, que inclui escritores aqui e ali. Um deles é Dostoiévski, que descrevia assim as “auras extáticas” que antecediam seus ataques epiléticos:
“O ar encheu-se com um barulho tremendo, e tentei me mover. Senti que o céu descia sobre a terra e me engolfava. Eu realmente toquei em Deus. Ele entrou em mim, sim. Deus existe, exclamei, e não me recordo de mais nada. Todos vocês, gente sadia, não podem imaginar a felicidade que nós, epilépticos, sentimos nos poucos segundos antes de um ataque. Não sei se essa felicidade dura segundos, horas ou meses, mas creiam-me que não a trocaria por todas as alegrias que a vida pode trazer.”
O outro é Nabokov e seus delírios aritméticos, em que lutava com “números impossivelmente grandes”:
“Quando menino, eu mostrava uma excepcional aptidão para a matemática, perdida em minha juventude singularmente desprovida de talentos. Esse dom teve um papel horrível em lutas contra amigdalites ou escarlatina, quando em sentia que enormes esferas e números imensos inchavam sem parar no meu cérebro dolorido.”
Há mais, inclusive delírios tipicamente artísticos ou literários – como os de Robert Hughes, Richard Howard, Henry James. Ou do próprio Sacks, que numa viagem ao Amazonas em 1996 deu para ter complexos e longos sonhos narrativos, acompanhados de febre. Sonhos, como ele descreve, em que “os personagens se vestiam, se comportavam e falavam exatamente como fariam em um romance de Jane Austen”. Logo com ele, que sempre preferiu Dickens.