Selos

Mesmo para pessoas que, como eu, viram o domínio do papel e dos envelopes na comunicação por escrito, os selos parecem coisas antigas, pertencentes a uma era indefinidamente anterior. Lambê-los para fazer cola, de maneira tão prosaicamente artesanal, só reforça essa percepção, e algo no serrilhado do picote parece garantir-lhes uma certa antiguidade perene. E, claro, há os temas e os desenhos: oficialistas, representando “vultos da pátria”, contentam-se no mais das vezes com traços simples, impressos em cores desmaiadas. Do ponto de vista do design gráfico, são, inegavelmente, uma catástrofe. Tecnicamente, ficam atrás de outros colecionáveis, cujo design é pensado para atrair o consumidor – latas de cerveja ou, sei lá, bolachas de chopp. Selos são, por assim dizer, colecionáveis estatais.

Contudo, pertencem àquela classe de objetos em que a precariedade se torna virtude – a mesma que torna apreciados velhos cartazes, fotos sépia, ruídos de agulha numa gravação ou filme tremidos (já falei um pouco disso aqui). É quando o aspecto arcaico, em seu apelo nostálgico e simbólico de um passado mais simples, supera até mesmo as deficiências técnicas e inspira um humor condescendente. A vantagem dos selos, contudo, é que eles “nunca são novos”. Vêm com o carimbo vintage de fábrica.

Sem essa ideia, creio, não se pode explicar a filatelia. Algo que, confesso, nunca compreendi direito. Os selos ucranianos aqui reproduzidos, por exemplo, parecem ter décadas, mas são relativamente recentes. Estão longe de serem bonitos – e não me dão nenhuma boa impressão da Ucrânia, que leva todo o jeito de estar ainda afundada numa estética comunista. Imagino ex-membros do partido decidindo homenageados, entregando a tarefa para desenhistas infelizes vestidos de cinza num prédio com vista para uma parede. Pode-se dizer, contudo, que possuem esse outro tipo de beleza de apelo nostálgico – mesmo que seja a nostalgia de um passado triste.

Publicado em 9/2/2010

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