Um livro interessante é Um Século em Nova York, de Marshall Berman (Companhia das Letras, 376 págs., R$ 55). Não que haja muita novidade ou originalidade no método do autor: ele elege um “centro de gravidade” — a Times Square — para contar uma história que mescla urbanismo, economia cultura, artes e imaginário, chegando, no fim, à política, fazendo um rerato da maior potência do planeta. Berman elenca, por exemplo, seriados e filmes cujos núcleos narrativos remetem, ora ou outra, para esse ponto de convergência entre a Broadway, a 42 e a Sétima Avenida, um lugar que se tornou uma meca tanto da cultura quanto da economia. Também nada novo até aqui.
A novidade está, sim, na maneira como ele lida com essas referências. Nesses filmes, peças de teatro, espetáculos musicais e seriados, o interessante não são tanto as cenas em que fulano ou sicrano aparecem sob os letreiros coloridos, naquele praça antes apinhada de carros e, agora, de gente e de cadeiras. É, antes, a maneira como Berman escapa, pelo texto, da armadilha descritiva, tão comuns em análises como essas. Em seus melhores momentos, faz com as palavras se sobrepor à obviedade das imagens, sem, entretanto, negá-la. O que é mais difícil do que parece.
O maior exemplo é, certamente, a célebre foto acima, tirada por Alfred Eisenstaedt no dia 15 de agosto de 1945, data da rendição do Japão e do fim da Segunda Guerra Mundial. O imaginário em torno dessa imagem — que reúne Times Square, um marinheiro e uma enfermeira num beijo ardente — se espalha por todo o livro. Paz, amor, sexo, felicidade, liberdade, vitória, democracia (e todas as suas antíteses, numa sociedade competitiva) são as linhas-mestras na análise de filmes como Um Dia em Nova York (1949) e Taxi Driver (1976), além do seriado Sex and City.
Num próximo post, darei exemplos mais concretos, mostrando tanto a maneira como Berman estará sempre referindo-se a essa espécie de “beijo inaugural” quanto a forma com que ele, repetidamente, usa imagens para achar novos sentidos, no que é um grande triunfo do texto.