Passageiro de uma ansiedade

Na fila da imigração, quem nunca ficou analisando os agentes, torcendo pra evitar o mais carrancudo?

Viajar é tão bom, mas tão bom, que nos sujeitamos a descer ao círculo do inferno onde ficam os aeroportos. Na ida tem lonjura, fila pra fazer check-in, pra passar na PF e no raio-x, onde é preciso caçar moedas perdidas nos bolsos, tirar notebook da mala, e, de nós mesmos, cinto e sapatos. No meu caso, na impossibilidade de remover o quadril biônico, ainda tem revista manual.

Depois, a felicidade do cidadão rumo às alentadas férias segue sendo testada, com eventuais atrasos e trocas de portões. Tem ainda quem não se segura e faz fila pra embarcar, como se os assentos não fossem marcados.

Na chegada, novas ansiedades. Se fôssemos associar lugares de passagem a transtornos psíquicos, as áreas de desembarque dos aeroportos ficariam bem com a paranoia. Muita gente se põe a analisar cada um dos oficiais da Imigração nas cabines, testando empatias. Torcendo para pegar o todo sorridente, não aquele carrancudo.

E se fôssemos associar situações da vida civil aos nossos humores, o “good morning” que damos ao oficial certamente se situa em um nível bem aceitável na nossa escala pessoal de simpatia. Ainda que, claro, muitas vezes completamente interesseira. É como se disséssemos: não vá arruinar minha férias, sou contra o terrorismo e estou muito bem (mais ou menos, mas não seria essa boa hora para desenvolver o tema) no meu país.

Carimbado o passaporte, é caminhar naturalmente até a esteira para tentar achar um lugar no meio da aglomeração e pegar sua mala. E se desta vez, finalmente, despacharam todas as suas calças, camisetas e roupas de baixo para a Mauritânia? Que demora.

E depois de todas as barreiras, chegando lá finalmente, nos divertimos, fazemos compras, comemos, postamos fotos de toda paisagem, monumento ou cidade. Como se ainda, na volta, não precisássemos repetir o ritual.

Com, no lugar da imigração, a alfândega. Na trilha do Nada a Declarar, muita gente como eu: olhando aquele sinal verde, verde de novo, ainda verde, eu sabia, vai ficar vermelho logo na minha vez.

Viagem e Turismo, abril de 2018
© Almir de Freitas