Solomon, o cara da Flip

Longe da Árvore é uma (extensa) pesquisa sobre os conflitos de pais que não se reconhecem nos filhos – entre as razões, casos de crianças surdas, anãs, nascidas de um estupro ou mesmo prodígios

Nesta edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que começa quarta-feira, o cara a ver é o jornalista e escritor americano Andrew Solomon. Na sexta, 1 de agosto (19h30), ele fala do recente Longe da Árvore (Companhia das Letras, 1056 págs., R$ 79,50/ R$ 39,90 em e-book). Pra quem ainda não leu a respeito, trata-se de uma (extensa) pesquisa sobre os conflitos de pais que não se reconhecem nos filhos. Entre as razões, estão casos de crianças surdas, anãs, nascidas de um estupro ou mesmo prodígios, dotadas de um talento excepcional.

Esse turbilhão de afetos desencontrados, ancorado fortemente na própria experiência pessoal do autor (no caso, a dislexia na infância e a homossexualidade na vida adulta), ecoa seu primeiro trabalho, o magnífico O Demônio do Meio-Dia, relançado agora (Companhia das Letras, 584 págs., R$ 42,50), cujo subtítulo é o autoexplicativo Uma Anatomia da Depressão.

Treze anos depois do seu lançamento, o livro ganha um novo capítulo. Numa pequena entrevista que fiz com Solomon semanas atrás, quando a novidade não tinha sido divulgada, perguntei se ele acrescentaria ou corrigiria algo no estudo. Confirmou que sim e me tirou da ignorância dos meus dias, falando o que ia no novo epílogo. “Tive algumas experiências com depressão desde aquela época, embora não tão graves como os anteriores. O conhecimento que adquiri foi bastante útil para mim na minha própria batalha. Algumas das pessoas sobre as quais eu escrevi estão incrivelmente bem agora; algumas ainda estão lutando.”

Para quem sofre de depressão (além da legião de hipocondríacos e ansiosos), o novo texto tem seus chamarizes. “Há novos medicamentos e novas abordagens para o tratamento. Estou particularmente interessado na pesquisa em torno da cetamina, droga que traz remissão rápida para as pessoas com depressão muito grave (embora não seja viável como tratamento a longo prazo neste momento). E também pelo trabalho na Estimulação Profunda do Cérebro, um procedimento cirúrgico no qual um eletrodo é implantado na área de Brodmann 25 do cérebro, visando a regularização da sua atividade. Isso trouxe alívio para as pessoas com depressão profunda, crônica e que não foram ajudados por outra coisa.”

No que se refere ao uso da experiência pessoal nos seus livros, Solomon foi singelo e preciso ao mesmo tempo. “Nós sempre partimos de nossa própria experiência. Muitos escritores não querem reconhecer isso. Um autor só pode se interessar por um assunto por meio de sua experiência do mundo. A escrita sobre a depressão nasceu da minha tentativa de dar sentido a minha própria depressão; Longe da árvore teve origem na minha tentativa de entender como uma doença pode tornar-se uma identidade, como a minha própria homossexualidade tinha sido para mim.”

Para completar, outra questão nem sempre observada por aí: o valor da empatia entre autor, personagens e leitores. “Cada livro acabou sendo muito a experiência dos outros, bem como sobre a minha própria. Eu senti que tinha que incluir o que vivi, porque essa era a minha qualificação para escrever sobre essas coisas. Como poderia o leitor ter confiança no que eu escrevia, se eu não explicasse a minha própria vulnerabilidade quando eu tinha pedido a tantos outros para compartilhar a deles?”

Huffpost Brasil, julho de 2014
© Almir de Freitas